panos soltos misturados tal qual manta de retalho

queremos lembrar-nos da infância...
recordar como eramos, se somos o que fomos...
tento puxar pela memória e relembro panos soltos misturados tal qual manta de retalho a qual ao longo dos anos veio a ser fiada sem que no entanto os pedaços fossem sequer iguais.
Já não sei do que me lembro, do que imagino, se imagino o que relembro se apenas vejo o que quero ver.

Sei, porque já revi, momentos fantásticos, imagens empoeiradas do tempo que já foi.
E o tempo vai passando e aos quadros embaciados pelos anos juntam-se imagens, sons, sensações e lembranças do pó do passado.

Às vezes quero abanar esse tempo e recordar claramente o que já era e como eu era.
Será que mudei?
O tempo... tudo muda... e a nós?
Acreditas que somos imutaveis ou transmutaveis?
Sofremos processos ao longo do tempo e de gás passamos a liquido, de liquido a sólido e novamente a gás...
Somos seres compostos, simples, orgânicos, inorgânicos, multicelulares, unilaterais, pensadores...
Temos variedade, emotividade, criamos, destruimos, amamos, estamos, isolamos, pensamos, fazemos, estamos cá, desaparecemos somos inatos, incontrolaveis sempre a perseguir o nosso futuro com âncora no passado.

Este é o quadro do meu presente, a voz do meu estar a luz com que me vejo.
As ideias, as opções, os caminhos que vamos tendo, perdendo, deixando ir, bailando ao som do Universo nesta festa que é estar aqui.
O momento único onde temos a consicência de ser.
Escolhi ter essa consicência.
Escolhi, revendo as imagens empoeiradas, perder a minha unicidade e ganhar algo muito maior.
Humanidade.
O meu legado é mostrar que apesar de todas as maldades da vida, dos Humanos, devemos e temos a capacidade de ultrapassar as nossas desilusões e perseguir sempre, sempre algo maior que nós individualmente...
Quero que saibas que mesmo nos momentos em que choro derrotada, consigo largar ao Universo a minha força de lutar contra, lutar a favor, lutar.
É a luta das nossas vidas que liberta a energia da constância.
Devemos, é nossa obrigação, andar, correr, voar por nós e deixar sempre, sempre um rasto daquilo que queremos para o Mundo.
Passa por nós pedirmos, implorarmos, exigirmos o melhor. sempre. sempre...

Olha para as tuas imagens empoeiradas, para os teus momentos enevoados e lembra-te quando eras criança.
Quando o salto era uma liberdade, quando a corrida era um concurso contigo próprio quando o Mundo girar era apenas produto da tua imaginação, quando o riso era solto e as ideias eram voláteis, quando o hoje era apenas um momento para o amanhã e tudo o que fazias era com a esperança de que um dia, quando fosses grande, o Universo ser perfeito.

Perguntas-te se estás sozinho.
Respondo-te: não. não estás.
Estamos todos juntos e somos nós que podemos mudar as coisas.
Passa por nós acreditar, formar, criar viabilidade para que o Mundo que existia nas nossas almas de criança se converta em realidade e que essa realidade seja tão somente o que queremos.

Esqueçe o que te ensinaram.
Viver não doi. Doi apenas viver não dando os passos em frente por mais que em frente seja apenas um abismo.
Anda. Dá o passo e imagina que na tua frente existe um novo Mundo. Aquele que construiste quando a tua mente pura acreditava ser possível.
Anda...
Caminha em frente e cria a tua ponte para o outro lado.
O lado onde as ondas caem de mansinho do céu, o vento bate nas rochas, a neve arrasta as poeiras das telas da imaginação e o sol caminha brevemente com passadas largas ao longo da costa enquanto a Lua brilha ao largo num qualquer barquinho de luz...
Deixa-te entrar por ti a dentro e vê que, enquanto te tiveres, estarás sempre na melhor companhia.
Aceita-te, vê o que tens vindo a criar e caminha, tal como o Sol, de mão dada com a tua manta de retalho a qual ao longo dos anos veio a ser fiada sem que no entanto os pedaços fossem sequer iguais.
E o caminho alarga, mais pontes são passadas, mais invenções são tornadas realidade e tu estarás sempre por aqui até que...

Asas crescem e tu voas...
E é nesse momento em que te vês de fora para dentro, consegues incorporar-te e compreender que mesmo a dor mais profunda é apenas uma reacção da acção de estar vivo, de ser.

17-Julho-2009
«one day i'm gonna grow wings on a chemical reaction, hysterical and useless»